São limitados  os dados científicos que sustentam a  tese de que o estilo de vida é importante  na prevenção ou no tratamento do glaucoma. Foi o que defendeu Simon Law, da Universidade da Califórnia, em Los Angeles, durante  o encontro anual da  Sociedade Americana de Catarata e Cirurgia Refrativa, o ASCRS-2023.

Segundo o pesquisador, intuitivamente, dieta, saúde mental e boa postura devem contribuir para uma boa saúde ocular, mas ele destacou a  escassez de estudos que apoiem essas ideias na prática e revelou que não fornece nenhuma sugestão específica sobre nutrição, saúde mental ou ioga para seus pacientes porque não acredita que existam evidências científicas  suficientes para agir assim.

Law destacou em sua apresentação que as orientações sobre a doença devem sempre enfatizar os benefícios comprovados das terapias convencionais para o glaucoma. E o que quer que os pacientes estejam fazendo – fora do tratamento – , isso não deve interferir ou servir como um substituto para a terapia convencional comprovada para o glaucoma.

Orientações dietéticas

O ditado “somos o que comemos” sugere que a nutrição é importante para a saúde e para a doença. No entanto, pesquisas sobre nutrição e glaucoma foram baseadas principalmente em teorias fisiopatológicas relacionadas ao glaucoma e não estão bem estabelecidas.

A maioria dos estudos até o momento foi transversal e baseou-se principalmente em questionários e pesquisas alimentares. A interação entre diferentes nutrientes, entre nutrientes e dieta e processamento de alimentos não foi estudada, apontou o pesquisador. A maioria das pesquisas falhou em controlar as variáveis, e os estudos abordaram o glaucoma como uma única entidade de doença, ignorando possíveis diferenças entre os subtipos.

Um estudo recente avaliou a sensibilidade ao contraste, 2 horas após o consumo de chocolate amargo ou chocolate ao leite e mostrou que a sensibilidade foi ligeiramente melhor após o consumo do primeiro tipo. Um estudo subsequente falhou ao replicar as mesmas descobertas.

Vários estudos examinaram os efeitos dos flavonoides e a saúde ocular, produzindo poucas evidências de suporte. Um estudo populacional de longo prazo não mostrou nenhuma associação entre a ingestão de flavonoides e o risco de glaucoma de ângulo aberto. Os dados do Nurses’ Health Study mostraram um pequeno efeito protetor de certos flavonoides encontrados no chá contra o glaucoma primário de ângulo aberto, mas não dos flavonoides em geral.

Anormalidades mitocondriais podem ser um fator inicial de disfunção neuronal no glaucoma. Estudos laboratoriais de nicotinamida e piruvato sugeriram um efeito protetor para a função mitocondrial, fornecendo uma justificativa para estudar os dois combinados em pacientes com glaucoma. Os dados preliminares mostraram uma melhora estatisticamente significativa a curto prazo na função visual em comparação com o placebo, mas as descobertas são muito precoces para tirar conclusões.

Estudos de ingestão de vitaminas e glaucoma produziram resultados conflitantes. Uma metanálise mostrou uma associação entre as vitaminas A e C e um menor risco de glaucoma, mas os níveis sanguíneos das vitaminas não se correlacionaram com o risco de glaucoma. A vitamina D tem associações com várias doenças, mas nenhuma ligação consistente com a pressão intraocular ou o glaucoma.

Estresse mental

A maioria das pessoas considera a visão seu sentido mais importante. O glaucoma, como uma condição que pode levar à cegueira, é estressante para muitos pacientes. A doença tem uma associação significativa com a depressão, com os principais fatores de risco que incluem doença avançada, idade avançada, sexo feminino e progressão mais rápida da perda da visão.

Além do potencial para perda da visão, fatores concomitantes podem aumentar o estresse da própria doença: carga financeira, comorbidades, eventos estressantes da vida e estresse relacionado à família e ao trabalho. Law costumava dizer aos pacientes que o estresse não contribui para a elevação da pressão intraocular (PIO). Sua opinião mudou depois que um estudo prospectivo que mostrou um pequeno aumento na PIO e uma tendência a pior desempenho visual em pessoas após um teste de estresse mental.

Um estudo avaliando ansiedade e depressão em pacientes com disfunção visual mostrou que a disfunção visual teve múltiplos efeitos adversos na qualidade de vida dos pacientes. Os pacientes reclamaram de frustração com a incapacidade de concluir tarefas e com a perda de independência que acompanhava os problemas de visão. Eles não tinham autoconfiança e se sentiam socialmente isolados e solitários.

Se o glaucoma estiver associado a transtornos de humor e o bem-estar mental puder afetar a eficácia e o resultado do tratamento, é preciso prestar mais atenção ao detectar o transtorno.

Ioga

Com a crescente popularidade da ioga, mais pacientes com glaucoma perguntam sobre o seu efeito na pressão intraocular (PIO). Algumas poses de ioga podem envolver a inversão do corpo, o que pode elevar severamente a  PIO. A PIO retorna à linha de base assim que o paciente retorna à posição sentada. A inversão prolongada deve ser evitada por pacientes com lesão avançada do nervo óptico.

Vários estudos demonstraram que a posição de dormir pode afetar a PIO. Em um estudo, 75% dos pacientes expressaram preferência por dormir de lado (posição de decúbito lateral). Três quartos dos pacientes com essa preferência tiveram piora no glaucoma do olho correspondente à posição de dormir.

Distúrbios do sono, apneia do sono, insônia e privação do sono são fenômenos comuns hoje. É preciso prestar atenção neles porque o glaucoma também está associado aos distúrbios do sono.

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